Série especial, capítulo 2: desfile das escolas começou nos anos 30, mas, às vezes, a polícia acabava com a festa no meio...
OS FUNDADORES: anos 30
Mesmo marginalizados e perseguidos, os sambistas do morro começavam a aparecer para o resto da cidade, no início dos anos 30. Muitos cantores importantes já os procuravam para comprar seus sambas e os jornais se interessavam por suas histórias. Até que um dos periódicos, o "Mundo Sportivo", resolveu fazer um campeonato entre as escolas de samba, na Praça Onze. E assim, em 1932, acontecia o primeiro desfile da história.
Milhares de pessoas acompanharam a disputa, que começou às 20h30m do dia 7 de fevereiro. Dezenove escolas participaram, mas só quatro foram classificadas: a Mangueira foi campeã; Vai Como Pode (Portela) e Segunda Linha do Estácio foram vice; e a Unidos da Tijuca ficou em 3. Na época, eram só seis jurados, que ficavam num coreto, abastecidos com cerveja, salgadinhos e sanduíches de mortadela.
A Mangueira venceria os dois carnavais seguintes. Em 1933, a disputa atraiu o interesse do jornal "O Globo", que organizou o desfile. E ali já se via o rápido crescimento do concurso: foram 25 escolas inscritas, mas também desfilaram outras dez, que apareceram na hora! Em 1934, o desfile aconteceu no dia 20 de janeiro, na festa do padroeiro, no Campo de Santana. Para se ter uma ideia do prestígio de cada manifestação carnavalesca, a receita dos ingressos foi dividida assim: 35% para as grandes sociedades, 30% para os ranchos, 25% para os blocos e só 7% para as escolas de samba.
Em 1935, finalmente o desfile se tornava um evento oficial, recebendo subvenção da Prefeitura — e enfim as escolas se organizavam numa entidade, a União das Escolas de Samba. Este foi o primeiro título da Portela. Na época, a porta-bandeira era uma menina de 15 anos, chamada Dodô. Hoje, aos 92, esta figura incrível ainda dá show de vitalidade na Avenida.
O delegado doente do pé
Uma das figuras que mais teve influência nessa história não era sambista nem gostava de batuque. O delegado Dulcídio Gonçalves, muito pelo contrário, era ruim da cabeça ou doente do pé. Em 1935, não quis renovar a licença da Vai Como Pode, por considerar o nome vulgar. Ele perguntou: "De onde vocês são?". Paulo da Portela respondeu: "Da Estrada do Portela". "Então a partir de hoje vocês são o Grêmio Recreativo Escola de Samba Portela", retrucou.
Em 1937, ele voltaria a interferir nos rumos do carnaval. Depois que a 16 escola desfilou, Dulcídio decidiu apagar a luz da Praça Onze e retirar as cordas que organizavam o cortejo. O problema é que havia mais 16 escolas para entrar! Mas o delegado não era homem de voltar atrás... E assim só metade das agremiações foi julgada, e a Vizinha Faladeira foi a campeã. Como Mangueira e Tijuca não desfilaram, a Portela é a única escola que participou de todos os desfiles até hoje.
Cartola e Paulo da Portela, os dois mitos fundadores
Nesta época, dois nomes se destacavam à frente das escolas de samba: Cartola e Paulo da Portela. Eles podem ser considerados "os fundadores" do que hoje é o maior espetáculo da Terra. Paulo foi um dos maiores líderes que essa cidade já teve. Sua luta pelo reconhecimento do sambista foi fundamental para a aceitação das escolas. Segundo ele, os integrantes da Portela deveriam andar de pés e pescoços ocupados (de sapatos e gravata), para não serem discriminados.
Cartola foi outro nome fundamental. Fundador da Mangueira, escolheu suas cores e fez os primeiros sambas com que ela desfilou. Depois, sua importância transcendeu a verde e rosa: o compositor gravou seu nome na história da MPB, com dezenas de clássicos gravados pelos maiores nomes da nossa música.
Paulo da Portela e Cartola foram muito amigos, mas tinham estilos diferentes. O primeiro era lutador; o segundo, agregador. Paulo era intelectual; Cartola, criador. Um era portelense; o outro, mangueirense. Mas têm algo maior em comum: são em grande parte os responsáveis por estarmos aqui hoje contando essa história.
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